quinta-feira, 28 de fevereiro de 2008

And he stole from the rich and the poor and the not-very-rich and the very poor and he stole all hearts away



Um dos mais brilhantes pensadores da história, o húngaro-americano John von Neumann (1903-1957) enxergava lógica onde parecia haver caos. Ele acreditava poder explicar, com fórmulas, a motivação por trás de qualquer empreendimento humano – do pôquer à concorrência empresarial. Dessa obsessão nasceu a Teoria dos Jogos, ramo da matemática que serviu de base para o diretor José Padilha, com formação em física, expor, em Tropa de Elite, os fatores quase intransponíveis que corromperiam policiais cariocas. A teoria estuda diferentes estratégias escolhidas por jogadores, em um dado ambiente, para maximizar suas vantagens. Exemplo famoso da teoria é o "Dilema do Prisioneiro", que explora as escolhas à disposição de dois presos colocados em celas separadas e instados pela polícia a se denunciarem mutuamente. E qual é a relação disso tudo com as favelas cariocas? Diz Padilha: "Quais são as regras às quais um policial no Rio está subscrito? Ele recebe 400 dólares por mês, é mal treinado e colocado numa estrutura corrompida. E a gente pede que ele faça valer a lei em favelas com pessoas fortemente armadas, com grande risco de morrer durante um longo período de tempo. Diante desse cenário, quais são as decisões racionais que ele pode tomar? O filme nem julga nem endossa personagens como o Capitão Nascimento; ele procura mostrar as ações e decisões que estão ao alcance deles dentro do jogo do qual participam". O filme, portanto, usou a razão para expor os fatores que levam policiais a se corromper. Com isso, ajudou a tirar a roupagem ideológica que cerca o debate sobre a criminalidade no Brasil.

Críticas negativas como a da Variety também não o incomodam: "É coisa de quem não entendeu o filme". Na opinião de Padilha, seus autores talvez não entendam a própria história recente. "É um hábito ver os eventos sociais pela ótica marxista ou pela ótica liberal, como se não existissem outros parâmetros. Então, é muito bom que Tropa tenha sido exibido em Berlim. Foi lá que caiu o Muro. E foi lá também que essa dicotomia morreu."

quarta-feira, 20 de fevereiro de 2008

I can be a nightmare of the grandest kind



You see everything, you see every part
You see all my light and you love my dark
You dig everything of which I'm ashamed
There's not anything to which you can't relate
And you're still here

quinta-feira, 14 de fevereiro de 2008

The Crying Game



A poltrona estofada, não consigo me lembrar de quando a adquirimos. Suspeito que fazia parte do apartamento mobiliado em que moramos aos nos mudarmos para Saint Louis. Para ficar com o apartamento tivemos de comprar a mobília que havia nele e, graças a essa circunstância, entramos na posse de alguns móveis que deixariam intrigados os cenógrafos de filmes sobre a vida da classe média baixa. Alguns desses móveis foram sendo gradualmente descartados ao longo das sucessivas mudanças de endereço, mas meu pai nunca quis se desfazer da poltrona estofada. E ela de fato dá a impressão de não poder ser removida de onde está. Parece larga demais para passar pelo vão de uma porta. Sua cor original era azul, um azul que não tinha nada de especial, porém o tempo transformou esse azul em algo mais triste que azul, como se ela houvesse absorvido em seu tecido e estofo todos os pesares e ansiedades de nossa vida familiar, como se tais emoções houvessem se tornado seu próprio estofo e pigmentação (se é que se pode dizer que uma poltrona possui pigmentação). E, todavia, ela não parece uma poltrona. Lembra mais uma pessoa gorda, silenciosa, mas silenciosa não por opção, e sim por não poder falar, pois se falasse não conseguiria concluir uma única frase sem antes explodir num pranto de autocomiseração.